Um brasileiro em terras portuguesas
Em relação com as árvores só de sombra, o árabe não deixou aos portugueses senão maus exemplos. Foi na Europa um inimigo, talvez se deva dizer, sistemático, das árvores grandes, altas e ramalhudas, nas quais viu, decerto, refúgios ou esconderijos para os nórdicos em tempo de guerra. Ou obstáculos à ocupação metodicamente económica do solo com pequenas árvores de fruto, com hortas e jardins, que devessem antes ser expostos a sol que defendidos dele por excessivas sombras. Na arquitectura doméstica, por meio de janelas e abalcoados em xadrez, nas cidades, por meio de ruas estreitas e de arcos, no vestuário, por meio de longos mantos ou xales, o árabe soube, como ninguém, desenvolver um sistema de protecção ou resguardo do homem contra os exageros do sol tropical. Mas fracassou com relação ao aproveitamento da árvore e dos jardins, talvez por se ter originado a sua cultura em áreas de árvores raras e pequenas.
Deste desamor do mouro ou do árabe à árvore muito temos sofrido, portugueses e descendentes de portugueses nos trópicos.
A verdade, porém, é que a quinta -pelo menos a quinta afidalgada- parece representar uma rectificação portuguesa -com influência quer dos antigos romanos, através dos Joões de Castro que os copiaram nos gestos, nas atitudes e nos estilos de vida patrícia, quer dos ingleses, que a doçura do clima foi atraindo aos arredores de lisboa- aos exageros de desamor às árvores altas, grandes e quase inúteis: desamor desenvolvido na Europa ibérica por árabes desejosos de aproveitar o máximo das terras para sua policultura útil, económica, bem dirigida. Desamor não de todo contrariado por frades ou monges cujo interesse nas extensões de terras sob o seu domínio se fixou antes na exploração agrária que na conservação, considerada por muitos deles talvez só estética -pecaminosamente estética- de matas ou paisagens. Mesmo assim parece que é principalmente a frades com alguma coisa de paisagistas em seu modo de ser latifundiários, que se deve o que há de coroado por arvoredo antigo e português na paisagem mais castiça. As matas, ainda hoje com alguma coisa de monástico, do Buçaco, por exemplo.
Gilberto Freyre (1951)
A verdade, porém, é que a quinta -pelo menos a quinta afidalgada- parece representar uma rectificação portuguesa -com influência quer dos antigos romanos, através dos Joões de Castro que os copiaram nos gestos, nas atitudes e nos estilos de vida patrícia, quer dos ingleses, que a doçura do clima foi atraindo aos arredores de lisboa- aos exageros de desamor às árvores altas, grandes e quase inúteis: desamor desenvolvido na Europa ibérica por árabes desejosos de aproveitar o máximo das terras para sua policultura útil, económica, bem dirigida. Desamor não de todo contrariado por frades ou monges cujo interesse nas extensões de terras sob o seu domínio se fixou antes na exploração agrária que na conservação, considerada por muitos deles talvez só estética -pecaminosamente estética- de matas ou paisagens. Mesmo assim parece que é principalmente a frades com alguma coisa de paisagistas em seu modo de ser latifundiários, que se deve o que há de coroado por arvoredo antigo e português na paisagem mais castiça. As matas, ainda hoje com alguma coisa de monástico, do Buçaco, por exemplo.
Gilberto Freyre (1951)
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