terça-feira, 3 de junho de 2014

Laços de seiva

(Est. VI)
Mário de Azevedo Gomes com o Eucalyptus obliqua L'Hérit. 

fotografia de Salvador Almeida Fernandes




Se as árvores recebessem a atenção que merecem tinham, tal como as pessoas, um bilhete de identidade e assim podíamos saber quando é que tinham nascido, quem é que as plantou, por onde anda a sua descendência, os acontecimentos importantes em que participaram... e por aí adiante. Sem esse tipo de registo só excepcionalmente conhecemos com rigor a vida de uma árvore. Este eucalipto que viveu 141 gloriosos anos no Parque da Pena é uma dessas excepções.

Foi ali plantado no dia do casamento de D. Fernando com a Condessa d'Edla e, 90 anos mais tarde, recebe toda a atenção de um dos nossos mais ilustres silvicultores que, descrevendo apaixonadamente esta árvore admirável, a imortaliza e ao mesmo tempo aproveita para homenagear aquela que foi uma das grandes responsáveis (até hoje) pelas árvores de Sintra, a sua avó Elisa Hensler, mais conhecida por Condessa d'Edla. O texto é o que se segue e, mais do que um bilhete de identidade, é uma carta de amor de um Engenheiro Silvicultor.


Exemplar N.° 6 (Est. VI): É um Eucalyptus obliqua L'Hérit. Trata-se dum dos três grandes fustes do Parque. Merece tanto mais a nossa admiração quanto é certo que a idade, neste caso conhecida com precisão, não o coloca entre as árvores mais antigas. Foi, de facto, plantado o exemplar na Feteira da Condessa, junto da linha de água principal, em 1 de Junho de de 1 8 6 9 (*), no dia do casamento de D. Fernando com a Condessa d'Edla e para assinalar o acontecimento. Quem conheça e saiba apreciar com justiça o que representou para o desenvolvimento do Parque da Pena, seu acabamento e conservação parcial ulterior, a presença desta Senhora, em vida do monarca e durante a viuvez até cerca de 1900, reconhecerá — como eu reconheço — que o testemunho daquela magnífica árvore, a maior do Parque, se ajusta com rara propriedade à sua função comemorativa. Estamos em presença dum tronco rotundo e maciço que vai até aos 7-8 metros com elevado diâmetro. Só esta porção do tronco cubará não menos que 12 m3 . Tem D. A. P. — 2 m, e uma altura total de 42 m ; pernadas e braças distribuem-se com bastante irregularidade, mas pode admitir-se um diâmetro médio de 25 m para projecção da copa. A árvore continua com regular vegetação e frutifica sempre, embora não muito abundantemente. Alguns núcleos desta espécie, com plantas de 30/35 anos, foram plantados e admito que a semente seja oriunda do exemplar estudado. É preciso dizer-se que foi afectado nas últimas ramas pelo ciclone que derrubou, aqui perto, alguns grandes exemplares de E. globulus.

( * ) Idade próxima dos 90 anos quando Azevedo Gomes escreve este texto.

por
MÁRIO DAZEVEDO GOMES

(A partir da pag 231 do pdf)


E num dia incerto do Inverno de 2010, poucos meses antes de completar 141 anos...
Obituário

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